A leitura do livro “Meia-noite em Bhopal” demonstra claramente como um projeto que poderia beneficiar o desenvolvimento de uma região e levar o aumento da renda e melhoria das condições de vida locais podem ser sabotados por administradores e equipes mal-treinadas e pela negligência com relação aos aspectos de saúde e segurança no trabalho.
A catástrofe de Bhopal aconteceu em 1984 e causou a morte de 30.000 pessoas e deixou 500.000 feridos. Desde o início do livro demonstram-se os aspectos fundamentais da indústria a ser implantada, a importância dos agroquímicos na redução das pragas que dizimam plantações e como as decisões e necessidades técnicas foram negligenciadas pelos gestores da empresa, com vistas a reduzir os custos com a operação. Estes custos reduzidos foram exatamente aqueles que representavam o investimento em redução do risco de operação da produção dos compostos químicos e, ao serem negligenciados, ocasionaram o desastre em escala gigantesca.
Os engenheiros da empresa e de outras empresas consultadas para elaboração do projeto básico avisaram sobre os riscos da estocagem do Isocianato de Metila e sobre as estruturas que deveriam ser instaladas no local para evitar que este composto altamente reativo e tóxico vazasse da usina de Bhopal e causasse a catástrofe humana que causou.
Num primeiro momento, a gestão dos riscos foi feita de forma adequada, com a empresa sendo considerada uma das mais seguras do mundo em sua área. Procedimentos padronizados, equipamentos ultramodernos, demanda pelo produto em alta na região e a população local e os governos locais envolvidos na operacionalização e possível sucesso da operação.
Infelizmente, com o tempo, os controladores da empresa nos EUA colocaram um administrador inexperiente em indústria química para presidir a unidade da Union Carbide na Índia. Este administrador passou a aplicar na administração da empresa os conceitos de redução de custos e aumento da eficiência, sem perceber as especificidades que garantiam a redução de riscos para os trabalhadores e para a comunidade que morava em torno da empresa.
Com isso, os controles necessários para reduzir o risco e os procedimentos padronizados para verificação das condições dos compostos químicos foram relaxados, causando o que eu chamaria de uma curva de “desaprendizagem” (sim, existem nas empresas também). A degradação das estruturas, a redução de custos justamente na área de segurança e a gestão inadequada do risco, que por fim resultou na perda de vidas das pessoas que não tinham nada a ver com a atividade da usina ou que a viam somente como oportunidade de melhoria das suas condições de vida.
Concluindo, é um livro fundamental sobre um caso emblemático de gestão inadequada de riscos e crises, tanto para quem estuda gestão de riscos e gestão em saúde e segurança do trabalho quanto para quem estuda gestão ambiental. Com base nas informações do livro, podemos perfeitamente identificar os pontos frágeis do processo de gestão adotado em Bhopal e a sucessão de erros e negligências que causaram a perda de milhares de vidas.
Adicionalmente, pode se ver como colocar administradores inexperientes em locais inadequados pode causar desastres com consequências sinergéticas sobre os sistemas de suporte das atividades econômicas. Tanto em indústrias, quanto em ministérios ou países.
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