“It is difficult to get a man to understand something, when his salary depends upon his not understanding it” – Upton Sinclair
O World Resources Institute, Think-Tank norte-americano em Sustentabilidade e Economia, lançou o relatório “State of The world 2015: Confronting the Hidden Threats to Sustainability“.
O instituto publica anualmente trabalhos deste tipo, reunindo os trabalhos de vários cientistas de áreas diferentes e analisando os temas emergentes que afetarão (ou deveriam afetar) as políticas de sustentabilidade para governos, empresas e sociedade.
A edição de 2015 destaca 9 temas emergentes e questões importantes para o gerenciamento dos riscos ambientais que aparecem no horizonte e deverão ser enfrentados pela sociedade, pelas empresas e pelos governos.
O primeiro tema vincula-se à produção da energia, do crédito e do fim do crescimento e neste tópico se introduz o conceito de Energy Return on Energy Invested (EROEI), que é a quantidade de energia necessária para produzir mais energia. Este conceito refere-se, em visão simplificada, à quantidade de investimento necessário para encontrar, extrair, transportar e distribuir energia em função da energia produzida e ao preço mínimo necessário para viabilizar investimentos em extração de energias fósseis com acesso difícil (o pré-sal é um destes).
A premissa na qual se assenta este conceito é a de que as sociedades modernas se desenvolveram em virtude da disponibilidade de energia relativamente barata e que a variação entre os investimentos necessários para viabilizar a extração das fontes de energia fósseis e o valor obtido tendem a ser negativos.
O segundo tema relaciona-se ao conceito da busca do crescimento econômico constante em um sistema fechado materialmente. Os autores argumentam que a riqueza da sociedade aumenta de forma diretamente proporcional aos impactos ambientais que gera e que a necessidade de separar a geração de crescimento dos impactos é urgente.
Neste capítulo os autores colocam novamente a conhecida equação IPAT, ou seja, à medida em que a população e a afluência tendem a aumentar nas próximas décadas, especialmente em países com grandes populações, é de se esperar que a pressão sobre os recursos naturais aumente, ainda que os sinais de degradação intensa já se façam sentir em todo o mundo.
O terceiro tema são os fundos encalhados (stranded assets). Como já tem sido explicitado neste blog, com base nos documentos internacionais publicados por diversas instituições, não é possível explorar todas as fontes de combustíveis fósseis sem inviabilizar a vida no planeta.
Os autores do capítulo argumentam que as reservas de combustíveis fósseis atualmente existentes são de 2.795 gigatoneladas e que, para limitar os impactos das mudanças climáticas o limite é o consumo de 565 gigatoneladas. Tais discussões estão evoluindo rapidamente e há a ameaça real de que determinados investimentos em expansão de produção de combustíveis fósseis sejam confrontadas com um ambiente bastante restritivo de negócios em virtude de crescente regulação internacional, baixo preço do gás natural e avanços tecnológicos em energias renováveis.
As pressões para a indústria do petróleo serão cada vez maiores, vindo da regulação sobre clima, os custos crescentes do acesso ao petróleo e os riscos geopolíticos relacionados a esta fonte de energia. Há um risco real de que reservas com alto risco não sejam exploradas e que os modelos de negócios de empresas de petróleo devam expandir-se para a produção de energia renovável também.
As perdas com a agricultura são tema do capítulo 5. Os estresses hídricos são tratados aqui, a perda da produtividade do solo, a necessidade da redução dos desperdícios e o aumento da produtividade da água, a redução da produção de proteína animal e biocombustíveis formam um cenário crítico para a evolução do tema.
Considerando a necessidade de alimentação de 9 bilhões de pessoas em 2050, há de se analisar quais são as escolhas que a sociedade deverá fazer para viabilizar a produção e a eficiência.
O capítulo 6 aborda mais um tema crítico: Os oceanos e a resiliência. A pesca insustentável, acima da capacidade de suporte dos oceanos, as mudanças climáticas causando acidificação e alteração das temperaturas oceânicas, os resíduos lançados nos oceanos são fatores de risco para a continuidade da produtividade primária dos ecossistemas oceânicos, com consequências para todas as cadeias alimentares, para a economia e para a resiliência do oceano global.
O capítulo 7 trata do Ártico e a abertura das rotas comerciais e da exploração dos recursos naturais e as dificuldades para realizar uma concertação entre os diversos atores sociais da região. O Ártico já tem sofrido grandes impactos com relação à deterioração das condições ambientais, com impactos para os países da região, que esforçam-se para gerar a gestão compartilhada dos recursos da região.
O capítulo 8 acrescenta o risco das pandemias para a humanidade e que, como o Ebola em 2014, tais pandemias podem ocorrer com mais frequência e maior letalidade, em virtude das diferentes condições de enfrentamento de pandemias entre países desenvolvidos e em desenvolvimento e nas conexões globais cada vez maiores entre regiões.
Por fim o tema das migrações como uma estratégia de adaptação em relação às mudanças climáticas, quando são analisadas as motivações para a migração e os possíveis impactos sociais e ambientais desta ação. Historicamente a busca de melhores condições de vida em função de guerras ou perda de capacidade econômica local foram pressões adaptativas determinantes para a migração.
As mudanças climáticas e as alterações ambientais por ela causadas servirão de pressões adaptativas para a migração. Os investimentos em infraestrutura para enfrentar o êxodo populacional, a deterioração das condições de vida e a insegurança poderão afetar ainda mais a capacidade das instituições de gerar bem-estar.
Fechando…
Apesar do post longo, o trabalho produzido pelo WRI justifica o detalhamento. As questões apontadas não são novidades para quem acompanha o tema sustentabilidade. Todos estes temas são abordados anualmente em diversos encontros globais. Já foram apontados por economistas ecológicos, ecologistas industriais, biólogos marinhos, sociólogos, economistas, administradores.
Certa vez a revista Scientific American perguntou a seus leitores se a humanidade conseguiria evitar passar o “ponto sem retorno” das mudanças climáticas. Ao verificar os cenários e indicadores globais, o vício no crescimento econômico, as tecnologias adotadas para acessar recursos pesqueiros cada vez mais raros, a xenofobia, os episódios de estresse hídrico cada vez mais frequentes e em todo o mundo, determinados discursos políticos, especialmente de países produtores de petróleo e países como o Brasil, que aspiram tornar-se um grande produtor com base em recursos de difícil acesso, a resposta para esta pergunta, infelizmente, seria NÃO.
Não conseguiremos evitar a passagem para o ponto de não retorno, onde as consequências negativas não lineares provocarão efeitos sinergísticos de difícil mensuração. A gestão de riscos vai até certo ponto, considerando uma trajetória de linearidade. Eventos disruptivos cada vez mais frequentes seguramente provocação a dissonância cognitiva que promove a mudança de comportamentos, mas somente após os eventos críticos.
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